Com apoio majoritário da base, Congresso aprova as chamadas ‘emendas de relator’
Em colisão com decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), o Congresso Nacional, em decisão conjunta da Câmara dos Deputados e do Senado, aprovou, em votação ocorrida nesta segunda-feira (29), ou regulamentou as chamadas “emendas de relator” ou “orçamento secreto”. A contradição coube ao governo, que por meio da base de apoio no Legislativo, aceitou abrir mão de gestionar fatia relevante do Orçamento federal.
É a primeira vez que o governo se permite à essa situação estranha. Isto é, abrir mão de controlar a liberação do Orçamento aos congressistas, pois isso consiste em definir relações políticas e de poder.
Isso caracteriza, que o governo está na “mão” do Centrão, que é bloco majoritário que controla o Congresso, em particular, a Câmara dos Deputados.
O PRN (Projeto de Resolução do Congresso) 4/21 foi aprovado pelos deputados por 268 votos favoráveis, 31 contrários, e uma abstenção; mais de duas centenas de deputados deixaram de votar. Em seguida, os senadores aprovaram o substitutivo (novo texto) da Câmara por 34 a 32. O texto vai à promulgação.
Burla à decisão do Supremo
“Primeiro, lamento de não votarmos vetos importantes, como o acesso a absorventes por meninas em situação de rua, meninas das favelas e periferias brasileiras, mulheres no cárcere. Segundo, não estamos fazendo isso para tentar burlar uma decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o vergonhoso orçamento secreto”, argumentou a líder do PSol, deputada Talíria Petrone (RJ).
“Não adianta. A resolução que está sendo votada aqui finge dar transparência àquilo que é imoral, ilegal, inconstitucional”, acrescentou.
Deputados do PSol, em manifestação no plenário da Câmara, disseram que vão ao Supremo, a fim de questionar a regulamentação do que, liminarmente, o STF se manifestou contrário.
Quebra de acordo
Para votar o PRN, a cúpula do Congresso e/ou os líderes da base governista quebraram acordo que haveria reunião dos líderes partidários antes da sessão para tratar sobre a pauta, disse o líder do PT, deputado Bohn Gass (RS).
“Eu saí daqui com a palavra empenhada do líder do governo de que a primeira sessão a ser realizada, divulgada, com a reunião precedida de todos os líderes, seria sobre vetos. Bem, essa foi a palavra do líder do governo, acertada com todos os líderes. Onde nós estamos agora? É o descumprimento da palavra. Nós valorizamos a palavra e isso foi acordado”, questionou o líder.
Sessão ilegal
“Como já foi até levantado em questão de ordem aqui no plenário hoje, esta sessão é absolutamente ilegal, descumpre todos os prazos do Regimento Comum, da Câmara, do Senado, do Congresso Nacional, não cumpre os 5 dias para a discussão do projeto, depois não cumpre os outros 10 dias para convocar nova sessão conjunta para a votação”, criticou o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP).
“Levando isso em consideração, o que é curioso no orçamento secreto é que geralmente quando se faz uma coisa boa, você quer mostrar para as outras pessoas. Boa parte dos parlamentares desta Casa se elege levando recurso para o seu Estado, levando recurso para sua prefeitura, para o governo do Estado, para o seu bairro, enfim, para a região que o elege. Agora ninguém quer levar os créditos pelas indicações já feitas no orçamento secreto”, observou a contradição que cerca o debate em torno do chamado “orçamento secreto”.
Obstrução e contrariedade
“O PCdoB manifesta obstrução a essa matéria. Este mecanismo de RP 9, a chamada ‘emenda de relator’, sempre existiu, mas ela foi completamente corrompida, distorcida”, criticou o deputado Daniel Almeida (BA) pela liderança do PCdoB.
“É um instrumento que se transformou numa verdadeira violência na execução orçamentária. Aquilo que era para mediar ajustes no orçamento passou a ser um instrumento de ação política, de desequilíbrio na ação política no Congresso Nacional. Portanto, não pode prevalecer. Por isso, o PCdoB manifesta obstrução.”
“Para quem não acompanha esse debate desde o início, é importante esclarecer o que nos trouxe aqui. Nos últimos 2 anos, cerca de R$ 20 bilhões de dinheiro público têm sido destinados não se sabe para onde, não se sabe a pedido de quem, não se sabe para fazer o quê e não se sabe se está sendo bem aplicado ou não através de uma manobra chamada orçamento secreto”, chamou a atenção o líder da Oposição, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ).
“Os parlamentares mandam um ofício ou ligam para o relator do Orçamento, que autoriza a destinação desses recursos sem tornar essas informações públicas. É uma completa aberração!”, esclareceu.
Direção inversa à decisão liminar do STF
“E se já não bastasse essa imperiosidade de sabermos para quem foi, temos, há bem poucos dias, a liminar da ministra Rosa Weber, que determinou a informação desta Casa sobre essa destinação, e, surpreendentemente, para espanto geral, não apenas de nós, parlamentares, como da população, dos jornalistas, foi dito que essa resposta não seria dada”, criticou o senador Lasier Martins (Podemos-RS).
“Isso é uma omissão tão grave quanto a clandestinidade da verba que foi distribuída”, asseverou.
Anomalia
“Durante 2 anos, o Estado brasileiro dispôs de R$36 bilhões — R$ 20 bilhões no ano de 2020 e R$16 bilhões no exercício até agora —, sem um ato institutivo”, destacou o líder da Minoria no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
“Criou-se uma anomalia. Essa anomalia se chama ‘emenda de relator’, RP9, orçamento secreto. Há alguns contra-argumentos eu acho alguns contra-argumentos na base do risível.”
“Como o orçamento é secreto? Eu vou explicar por que o orçamento é secreto”, continuou Randolfe.
“Primeiro, cria-se uma figura: RP9, emenda de relator. E é essa figura que passa a distribuir mais recursos do que todas as transferências que essa mesma rubrica do orçamento fez durante toda a década. É isso. Só o ano passado é que essa figura do orçamento público passou a ter um salto para a altura de quase R$ 20 bilhões, que não tinha durante toda a década”, explicou.
“A pergunta preliminar, para todos que estão nos assistindo entenderem, é a seguinte: onde foram parar R$ 36 bilhões? Para onde foram? Foram distribuídos entre os parlamentares. Quais Parlamentares? Para quais Estados? Para onde foi destinado? Quais Estados receberam esse recurso?”, questionou.
“Eu sei até que o meu Estado recebeu, mas quem foi que colocou o recurso lá? Quais são os parlamentares, deputados e deputadas, senadores e senadoras, que foram os beneficiados, esses seres benditos?”, completou.
Que são as “emendas de relator”
As chamadas “emendas de relator” são ferramentas criadas pelo Orçamento Impositivo que dão ao relator da LOA (Lei Orçamentária Anual) o direito de encaminhar emendas que precisam ser priorizadas pelo Executivo.
Como não são claramente discriminadas nos sistemas nos quais é feito o controle da execução orçamentária, também são chamadas de “orçamento secreto”.
A Câmara dos Deputados, de acordo com a Nota Técnica 63/21 da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira, de 8 de novembro de 2021, expõe que as emendas do relator “tradicionalmente, são utilizadas com a finalidade de corrigir erros ou omissões de ordem técnica do projeto de lei orçamentária, ou seja, um instrumento colocado à disposição dos relatores para que possam cumprir a função de organizar e sistematizar a peça orçamentária”.
Tipos de emendas ao Orçamento federal
Existem 4 tipos de emendas feitas ao Orçamento federal:
1) individual, 2) de bancada, 3) de comissão, e 4) de relatoria. As emendas individuais são de autoria de cada senador ou deputado.
Fonte: Diap
Noti-América/ Brasil
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